- 1865 é considerado o ano da abolição da escravatura. É também habitual fixar o nascimento do blues em finais do séc. XIX, quando os agora ex-escravos negros, que habituados a trabalhar em equipe e a cantar em coro, se tornam camponeses em pequenas fazendas isoladas.
O blues é um canto improvisado na linha melódica ou no texto, ambos criados e chegando a um formulário tradicional. Existe sempre acompanhamento instrumental, por acção do cantor ou de outros (na origem com banjo, depois com guitarra ou piano).
Do simples grito modulado, o blues tornou-se rapidamente um refinado género de art folk, dominado por especialistas, muitas vezes cantores cegos ambulantes que viviam da caridade (blues rural).
No início do século XX e com a atracção de milhares de negros para as fábricas e cidades do norte, fruto da industrialização, o blues foi então “descoberto” pela industria da música, publicada em livro e em disco, e rapidamente se transformou num género teatral cantado por mulheres (blues urbano).
Os textos tratam de situações negativas (amor desiludido, abandono, prisão, morte, fome, desastres naturais). Na sua forma mais comum, cada estrofe tem três versos, dos quais dois semelhantes (A A B), e ocupa doze compassos de música.
A música dos brancos e europeus assentava sobre os modos gregorianos , ou seja, a escala diatónica, como hoje a conhecemos, formada por 7 tons ou notas, correspondentes às teclas brancas no teclado do piano: DO, RE, MI, FA, SOL, LA, SI, (ou , em inglês: C D E F G A B).
As escalas africanas baseavam-se apenas em 5 dessas notas: DO, RE, FA, SOL, LA (escala pentatónica).
Como é natural, ao cantarem, estranhando o 3º e o 7º graus, MI e SI, era frequente hesitarem entre a 3ª maior e menor, entre o MI e MIb, e entre a 7ªmaior e menor, SI e SIb, originando, com esta inconstância e insegurança sobre qual nota emitir, uma hipótese de variação naquelas notas, apelidadas de BLUE NOTES, porque ao passar-se na tonalidade maior para uma toada menor, o cariz, ou carácter, temperamento, espírito, o que lhe queiram chamar, fica mais melancólico, mais triste, na língua inglesa... mais...BLUE.
Esta nova variação resultante da aculturação foi invadindo primeiro timida e depois assumidamente, pois agradava a parte da população branca, que notara as claras aptidões para o canto, o ritmo e a dança por parte dos negros, e que constituía a única coisa que lhes fora permitido trazer: a sua herança cultural africana!
Mas para além dos cânticos religiosos, apelidados de ESPIRITUAIS ou GOSPEL (god+spell = a palavra do Senhor), que aconteciam ao Domingo, os dias de trabalho foram também contemplados por cânticos de trabaho ou WORKSONGS.
Utilizando a marcação sempre presente que constituía por exemplo, o martelono caso dos carris, ou a picareta e a pá nos trabalhos agrícolas, o tempo que separa uma martelada da outra era preenchido por uma voz de incitamento ou de marcação à qual todos respondem em uníssono, numa espécie de refrão. Ou seja: tempo forte(upbeat)=martelo / downbeat=voz marcação / tempo forte=martelada / downbeat=vozes refrão.
Esta fórmula foi tendo variações e alterações conforme o tipo de tempo (velocidade da acção) que o trabalho originava. A WORKSONG, juntamente com o GOSPEL, está na raiz direta das primeiras formas de BLUES, que surgiram durante o tempo livre e de lazer, mas infelizmente para os escravos não transmitiam, como se poderia esperar, o grito de revolta ou a palavra que poderia incitar à luta pela liberdade. E isto porque os escravagistas brancos proibiram a utilização de outra língua nas canções que não fosse o inglês, assim como quaisquer tambores ou percussões, pois poderiam relembrar África e servirem como incitação à rebelião, pois a música africana executada em tambores tem sequências e motivos rítmicos que significam ideias, são traduzíveis em expressão oral, simbolizam mensagens. Ora tudo isso eram riscos que os brancos ricos do sul não estavam dispostos a correr. E deixavam bem clara a punição que sofreria aquele que ousasse desafiá-los, através dos linchamentos e execuções públicas levadas a cabo sob a capa sanguinária e ensanguentada do Ku Klux Klan.
Deste modo, os primeiros BLUES estavam limitados a expressarem pequenas estórias românticas, crónicas vivênciais, lamentações do coração.
Os Blues eram cantados nas ruas, e mais tarde nos cabarets. Inicialmente, eram pedintes cegos que pendiam para o romance e a ladainha. É construído sobre 12 compassos. Muitas vezes o cantor começa por um break, isto é, uma fantasia de poucas notas, uma frase perfeitamente esculpida, baseando-se nos 4 primeiros compassos, revelando a melodia principal somente a partir do 5º compasso. Um ponto culminante, a nível emocional, é a passagem que se efectua do 4º ao 5º compasso (subida à 4ª) e do 8º ao 10º compasso (subida à 5ª, desce à 4ª, volta à tónica). Estes pontos-chave eram aguardados impaciente e ansiosamente pelo público negro e frequentemente originavam gritos de satisfação.
O primitivo blues foi evoluindo com a entrada no séc XX, influenciou o RAGTIME, introduzindo BLUE NOTES em marchas, polcas e quadrilhas de origem europeia.
Os Blues começaram a experimentar diferentes cadências, diferentes tempos, ritmos, tonalidades, arranjos, instrumentações. Tanto prosseguiam o seu percurso junto com a guitarra desde os DELTA BLUES, utilizando o polegar e o bottleneck (gargalo de garrafa) sobre as cordas, ramificando-se para o TEXAS BLUES de T-Bone Walker, Lightning Hopkins e BBKing, para o COUNTRY BLUES, evidenciando forte influência irlandesa e transformando-se na música dos cow-boys, como também soavam em ritmo sincopado, executado nos primeiros anos por banjos e tubas, nas orquestras de King Oliver, Bix Beiderbeck e na Louis Armstrong HOT FIVE em New Orleans, gerando DIXIELAND. Instrumentos esses que deram lugar à guitarra e ao contrabaixo, aos quais se veio juntar a recém inventada bateria de jazz.